VIVER E SOBREVIVER EM CONFINAMENTO DOMICILIÁRIO EM TEMPO DE PANDEMIA.























Inspirei-me no pensamento do Prof. Rodrigo de Sá-Nogueira Saraiva para explicar a razão porque me decidi a fazer esta abordagem.

Sou um indivíduo minimamente sociável, embora quem me conheça de situações públicas, ou de comunicação em público, possa pensar que sou hiper-sociável.
Poderei dizer que estou habituado a momentos relativamente longos de solidão: solidão a dois, ou seja “solidão acompanhada” e também solidão a um.
Talvez isso me dê alguma propriedade para reflectir sobre esta temática – mas pouca, uma vez que as pessoas não são todas iguais, nem a minha peculiar forma de estar seja uma referência, digamos comum.

Então como podemos actuar em situações de confinamento domiciliário, designadamente a que vivemos nestes tempos novos e incertos, resultantes da pandemia do novo corona-vírus?

1. Manter uma rotina produtiva: ler, escrever, estudar, praticar um hobby de interior de casa, organizar, arrumar e limpar espaços há muito descorados, como estantes de livros, armários e gavetas etc.
Tanto quanto possível manter os horários que nos são naturais, como hora de deitar e levantar, refeições, higiene pessoal.
Não estar constantemente a pensar na epidemia embora seja imprescindível estar informado.  Basta ver e ouvir uma vez por dia os noticiários de TV e rádio e não se deixar prender pelos contínuos de noticiários repetitivos e por vezes irrelevantes, dos canais de notícias.
De igual modo, o uso e abuso das redes sociais, designadamente por utilizadores muito “linkados” com páginas de comunicação social e de outros utilizadores com os mesmos interesses editoriais, leva a uma sobressaturação informativa, muitas vezes constituída por “fakenews”. Sabem como funcionam os algoritmos do Facebook em matéria de fidelização às temáticas e aos utilizadores que consultamos mais vezes. 

2. Nas relações inter-pessoais/íntimas/conjugais ou simplesmente de coabitação,  afigura-se necessário ser extremamente tolerante. Mas depende muito das pessoas; há-as que se unem muito nestas alturas; outras há que precisam de espaço físico e psicológico. Em qualquer caso deve-se ser particularmente tolerante nesta fase.

3. Nunca, mas NUNCA, deixar escalar as discussões. Quando as pessoas se zangam, a única coisa a fazer é dizer que não vale a pena continuar a discussão, que não adianta falar em estado de enervamento/exaltação, sendo preferível dizer que no dia seguinte, com a cabeça fria, se analisa a situação.
É importante que os dois peçam desculpa. Uma casa grande ajuda. Há sempre lugares em que o afastamento é possível: o quarto, a cozinha, as varandas e terraços e no limite a casa de banho. É bom compreender que os casais/companheiros neste tipo de situações, são uma unidade que deve cooperar, independentemente do que estão a sentir um pelo outro no momento, sendo que por isso, não se podem zangar mesmo.

4. Em caso nenhum uma pessoa se deve relaxar nos hábitos que normalmente teria se estivesse com outros: ou seja, os nossos cônjuges/companheiros(as), merecem-nos o mesmo cuidado na apresentação e nas boas maneiras, que teríamos perante pessoas desconhecidas ou que mal conhecemos. E mesmo para nós, é importante conseguirmos manter a imagem de nós próprios, aprumada, asseada, cuidada.

5. Neste caso concreto da pandemia, é importante compreender que sair de casa é um risco para nós e para os outros: uma dose pequena de medo é boa, porque nos dá motivação suplementar para não sair. Isto claro, sem entrar em histerismos ou obsessões sanitárias ou securitárias.


6. Quem vive sozinho poderá sentir uma grande dificuldade em lidar com esta situação.
Há bastantes anos, numa condição muito especial e peculiar, fiz a experiência de ficar sozinho, sem ver absolutamente ninguém, durante o período mais longo que me foi possível. É muito difícil.
A partir de certa altura, subsiste a necessidade de ver gente, ir à rua, ao supermercado/centro comercial, etc. Nestas condições, aqui sim, a tecnologia ajuda bastante, quer no uso das redes sociais, quer nas plataformas de “streaming” tipo Netflix ou outra, para não falar na leitura.
No fundo, descomprimir o mais possível. De preferência deve-se optar por filmes/séries/livros leves, tipo comédia, acção e evitar conteúdos pesados, dramas, terror etc. 

7. Devemos evitar pensamentos depressivos. Sabemos que é difícil. Nem toda a gente domina as chamadas técnicas de relaxamento ou meditação, por forma a disciplinar a mente.
Mas neste caso concreto que estamos a passar, devemos evitar pensar que tudo vai correr mal.
Uma das ideias que ocorre a quem é ansioso é pensar coisas do género: «a probabilidade de morrer é de 1%, mas se for eu a morrer a probabilidade sobre para 100%». É justamente o que não se deve pensar, antes pelo contrário: Se a probabilidade de morrer é de 1% a de não morrer é de 99%.

8. É útil pensar no seguinte: se conseguir fazer tudo o que é possível para evitar o contágio, não podemos fazer mais nada. Ou seja, controlámos o que pudemos, e não adianta ficar angustiado por não podermos fazer mais. É puro dispêndio de energia.

9. Escuso de dizer que não se deve abusar do álcool ou substâncias ilícitas; se em doses muito baixas acalma, em doses altas pode funcionar como um depressor, além de que diminui o auto-controlo, não é?

10. Para quem é mais introspectivo, escrever um diário ajuda. Mas sei que isto não é tarefa para toda a gente. Analisar as próprias emoções pode ser bom ou mau: depende das competências para o fazer e por isso não é coisa que se recomende a todos.

11. Por último, sobre o controlo das próprias emoções.
Esta parte é mais difícil de explicar e talvez de compreender porque normalmente temos muito má linguagem para descrever os nossos processos mentais.
Sugiro uma estratégia que tento seguir em muitas situações: entre o acontecimento que me alarma, me irrita, me perturba, e a reacção que exprimo em linguagem ou actos, tem de passar um momento, um tempo.

Apresento a coisa assim: Muitas vezes, aquilo que nos atinge pede uma reacção imediata, como que epidérmica, quase reflexa.
Mas pode-se tentar, antes de agir, observar essa tendência para a reacção e inibi-la.
Dou um exemplo para que se compreenda:
Há pessoas que dizem tudo aquilo \que pensam.
Mas podemos não o fazer: podemos ter uma resposta imediata e vontade de a dizer alto, mas podemos não o fazer e pensar se é adequado falar e dizer aquilo que nos vai na cabeça e depois decidir se falamos ou não.

É o mesmo com as emoções: sentimos o impacto de uma coisa, temos uma resposta pronta, mas podemos «olhar para ela» e ver se é adequada.
Bem sei – nem todos conseguem fazer isto. Mas é uma técnica que se aprende.
Pode-se explicar assim: as reacções imediatas sentem-se entre os olhos e no peito; mas se conseguirmos sentir-nos (colocar-nos) atrás disso, atrás dos nossos olhos, conseguimos como que ser espectadores das nossas próprias reacções, avaliar o que sentimos e assim a controlar as reacções impulsivas.

Não sou clínico, muito menos psicólogo. As minhas áreas de especialidade são a segurança e saúde no trabalho e a comunicação educacional. De modo que o que aqui digo é fruto da minha experiência e conceptualização empírica, isto é, vale o que vale!

Acho que a única coisa que me pode referenciar nesta análise, é ser um pensador de natureza existencialista e ter idade e vivências suficientes para acumular experiência de situações diversas, no que respeita ao auto e hetero-conhecimento em situações de crise.

Com cantava Glória Gaynor, “I will survive”

João Saltão

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