O AMBIENTE PERDIDO DA ILHA DA MORRACEIRA




No território municipal da Figueira da Foz, a riqueza excecional dos recursos naturais, associados à extensa linha de costa, o estuário, as lagoas inter-dunares e mesmo os cursos de água, desde sempre justificaram a necessidade de um plano estratégico no âmbito da implementação e desenvolvimento de atividades turísticas sustentáveis que constituam uma alternativa ao “clássico” turismo sol/mar/praia.

No que respeita ao estuário do Mondego, afigura-se de extrema importância estabelecer um Plano de Valorização Turística da Ilha da Morraceira, que passa pela implementação de uma estratégia concertada e integrada que respeite os valores ambientais intrínsecos, promovendo a sensibilização ambiental dos visitantes, bem como a divulgação dos principais aspetos culturais e dos valores locais associados à salicultura e à observação da avifauna (birdwatching).

Desenvolvendo-se por uma área de cerca de 35 Km2, o estuário do Mondego assume-se como uma unidade geográfica central no território concelhio da Figueira da Foz, separando fisicamente os setores sul e norte deste concelho, apresentando vastas extensões de sapais e caniçais, bem como de salinas, aquaculturas/pisciculturas e arrozais, desenvolvendo-se pelos territórios das freguesias de Lavos, S. Pedro, Vila Verde e S.Julião.

Este território, ou seja a Ilha da Morraceira e restantes áreas do estuário, é caracterizado por uma grande riqueza de fauna e flora, observável ao longo de todo o ano.
As suas características morfológicas e climáticas são também a razão de ser de, historicamente, a exploração do sal na Ilha da Morraceira e, genericamente no Estuário do Mondego, ter sido uma das principais atividades económicas existentes no território municipal, na medida em que este local apresentava características únicas (mesmo em termos europeus) das quais resultavam uma produção de sal com determinadas especificidades, difíceis de encontrar nas restantes regiões salineiras portuguesas (Ribeiro, 2005; 2006).

Sendo um local de grande biodiversidade, o Estuário do Mondego e a Ilha da Morraceira como parte integrante do mesmo, destaca-se pela presença de vegetação típica de áreas salobras associadas a estuários, designadamente a vegetação anual na área de sapal baixo e salinas abandonadas como a Salicornoia ramosissima, entre outras.

No que respeita à avifauna destacam-se seis espécies de aves que representam cerca de 89% do total de aves limícolas presentes na Ilha da Morraceira, designadamente o pilrito-de-peito-preto e o pernilongo entre outros.

Já em termos das características económicas e culturais é de destacar o facto da Figueira da Foz se encontrar entre os cinco principais salgados da costa portuguesa (os quais se encontram localizados entre a “Ria” de Aveiro e a Foz do Guadiana), embora deva ser referido que a sua importância económica tem vindo a decair ao longo do último século, muito por força das transformações introduzidas na conservação dos alimentos.

Assim, a importância histórica e ambiental do salgado motiva a necessidade de requalificação desta atividade no sentido da sua preservação, promoção e criação de novos caminhos para a utilização do sal, bem como revitalização de todo o salgado, numa perspetiva de manutenção do equilíbrio dos frágeis ecossistemas deste setor do território concelhio.

Associada à necessidade de se pugnar pelo equilíbrio deste ecossistema, outra atividade que deve ser devidamente equacionada é a aquacultura, já que este setor do território apresenta condições ecológicas que permitem às diferentes espécies, alcançar taxas de crescimento bastante satisfatórias e que poderá assumir grande importância em termos de rentabilidade económica. As espécies mais produzidas na ilha são o robalo, a dourada, o sargo, o linguado, a tainha, a enguia, e, recentemente, as ostras e as amêijoas.

A agricultura biológica e a exploração de algas para fins medicinais, embora com fraca representatividade, são exemplos de boas práticas onde a sustentabilidade se encontra patente pela aliança entre a componente biológica, a criação de alternativas para a dinamização do espaço e a constituição de outras atividades económicas, contribuindo, assim, para a dinamização e promoção deste território.

Esta riqueza ambiental, ecológica e patrimonial do salgado estuarino justifica a existência de uma ainda embrionária componente de lazer e turismo associada, que presentemente está restrita ao setor de Armazéns de Lavos, e que se materializa na existência de duas rotas, nomeadamente a Rota das Salinas (pedestre) e a Rota Fluvial Sal do Mondego, ambas associadas ao Ecomuseu do Sal.

Justificava-se, assim, a implementação de um projeto integrado que mais do que enunciar um conjunto de medidas de conservação, pugnasse pela valorização turística não só em matéria de cultura e património, mas fundamentalmente, pela valorização daqueles ecossistemas.

Tal desiderato deveria ser assumido pela Câmara Municipal da Figueira da Foz em articulação com o Turismo do Centro, envolvendo diversas áreas, tais como ao ambiente, o ordenamento do território, o desporto, o património cultural, a saúde, entre outras, no sentido de sensibilizar a sociedade civil para a necessidade de promoção da Figueira da Foz como destino turístico diferenciador e de qualidade.
Talvez assim o Turismo do Centro venha a assumir e incluir a Figueira nos seus vídeos promocionais, donde foi apagada há muito … e em parte com alguma razão.

João Saltão



Comentários

  1. Toda essa zona tem um ar de abandono difícil de compreender dado o aparente potencial. Nestas coisas, o que mais me preocupa é a vocação para estragar patenteada, geralmente, pela administração pública e pela propaganda partidária. (Belo trabalho)

    ResponderEliminar
  2. Alice Mano-Carbonnier15 de abril de 2019 às 04:26

    Excelente artigo! Talvez o actual Secretário de Estado do Ambiente queira agora, na sua nova posição, dar alguma atenção ao assunto...

    ResponderEliminar
  3. Passados todos estes anos, e agora que se perfilam eleições autárquicas para Outubro de 2019, vamos ver o que os candidatos propõem (em concreto) sobre este tema, incluindo o Presidente do Turismo do Centro, também ele candidato.

    ResponderEliminar

Enviar um comentário