PRAIA DA CLARIDADE OBSCURA


















Quem visitar a Figueira da Foz, facilmente compreende que a intervenção humana no sistema costeiro, quer a norte quer a sul da foz do Mondego, introduziu factores de perturbação profunda da deriva sedimentar natural, que interrompeu o transporte de sedimentos a norte do molhe de protecção da entrada do porto, sendo que o seu prolongamento agravou muito sensivelmente o problema.
Actualmente, o areal da Figueira da Foz cresce cerca de 40/50 metros de largura por ano, enquanto que, como é expectável, na zona a sul da foz do rio, a erosão faz com que o areal de algumas praias diminua de forma preocupante.
Independentemente das soluções técnicas que possam ser equacionadas, é cada vez mais claro que o problema necessita de uma solução urgente e que essa solução passa pelo restabelecimento da deriva sedimentar a sul da barra e pela preservação da dinâmica costeira natural da zona.
Entretanto consultei um estudo bastante curioso com o título "Frente de mar da Figueira da Foz - Hipóteses para o espaço lúdico", de autoria do Arquitecto João Miguel Moreira Negrão. Trata-se de uma Dissertação de Mestrado integrado em Arquitectura, do Departamento de Arquitectura, FCT da Universidade de Coimbra, Julho de 2016.

As considerações do estudo apontam para a imagem pouco apelativa e para o subaproveitamento da frente marítima da Figueira da Foz, em particular da avenida marginal e do areal, enquanto espaço potencialmente lúdico e atractivo.

Ao considerar a dimensão da marginal e a diminuída relevância da Figueira da Foz enquanto estância balnear, em relação à que tinha na segunda metade do século XX, aparenta ter havido uma acomodação da cidade face ao mar distante, e ao passado próximo, que alguns parecem dar como perdidos.

É um facto que, enquanto destino turístico, o lugar perdeu proeminência para outros que, de forma diferente são mais atractivos nos seus programas e ofertas. Quer dizer, portanto, que a Figueira da Foz parece não ter acompanhado a concorrência no que diz respeito à valorização da sua imagem e dos seus espaços, e o exemplo óbvio é a sua avenida marginal que, apesar dos atributos, não se fez esmerar na actualização da sua imagem e experimentação.

É também um facto que os aspectos paisagísticos da frente marítima da Figueira da Foz, bem como o cenário que produzem, constituem uma qualidade evidente daquele espaço da cidade. No entanto, por si só, não são suficientes para a atracção de novos negócios e turistas à cidade, e nem mesmo para retenção da população (residente e balnear), na avenida marginal que, em período coincidente com o do processo da sua urbanização, viu o areal expandir-se progressivamente a partir da linha de costa.

A consequência crescente dessa expansão é o afastamento drástico e contínuo do mar, que se vem devendo à prolongada e recorrente deposição de areias a norte do molhe da barra portuária da Figueira da Foz.

Há aqui como uma espécie de dicotomia, algo irónica, entre por exemplo a cidade de Las Vegas (salvo as devidas diferenças) que cresceu em torno de uma estrada de deserto, e o ‘deserto’ que cresceu em frente à ‘estrada’ marginal da Figueira da Foz, leia-se Av 25 de Abril e Av do Brasil.

A consequência crescente dessa expansão é o afastamento drástico e contínuo do mar, que se vem devendo à prolongada e recorrente deposição de areias a norte do molhe da barra portuária da Figueira da Foz.

Ao longo destes anos têm surgido diversos projectos (mais ou menos mirabolantes como o da foto, nem por isso desinteressantes), contemplando soluções urbanísticas, provisórias ou perenes para a dinamização da frente de mar da Figueira da Foz e promoção da sua imagem, enquanto destino balnear de turismo e lazer, sendo que, feliz ou infelizmente, não têm sido postos em prática, para além do projecto que a Câmara seleccionou e adjudicou a um arquitecto de Aveiro, ou seja, os famosos passadiços e a ciclovia que acabou por construir no areal, cujo impacto paisagístico e integração urbana da frente marítima da cidade, ficou muito a desejar.
Entretanto o Presidente da Câmara anunciou que a Agência Portuguesa do Ambiente (APA) irá fazer um estudo sobre os custos e benefícios da instalação de um sistema mecânico fixo (bypass) de transposição de areias do areal da Figueira da Foz para as praias a sul da barra.

Já agora, na minha modesta opinião, a Câmara poderia também aproveitar a oportunidade e propôr aos responsáveis pelo estudo, outras soluções, como por exemplo, a construção de uma lagôa interior de água do mar no areal da praia, alimentada por gravidade e/ou bombagem, devidamente apetrechada com equipamento e mobiliário urbano, para fruição dos banhistas em águas do mar tranquilas.  
   
Oxalá que aquele estudo não demore muito tempo, a fim de uma vez por todas, se definir um desígnio para a relação ambiental, urbanística e turística da cidade com a sua praia.                


João Saltão

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