DESCENTRALIZAÇÃO OU DESCONCENTRAÇÃO DE COMPETÊNCIAS
























Quando em Março do ano passado se reuniram em Sintra, pela primeira vez na história da democracia portuguesa, todos os autarcas dos 35 municípios das áreas metropolitanas de Lisboa e Porto, sob o patrocínio do Presidente da República, parecia que estavam reunidas as condições para se iniciar um processo de descentralização real e efectivo, com uma autêntica e consensual passagem de competências para as autarquias locais.
A actual proposta do Governo, não trata de qualquer transferência de competências, mas sim da desconcentração de um conjunto de procedimentos administrativos afectos a organismos da Administração Central para as autarquias locais.

Uma competência é o poder de tomar decisões, o poder de gerir e de dispor, de acordo com aquele que seja o entendimento, do interesse público, ou seja, do interesse da comunidade representada pelos seus legítimos e directos eleitos, ao contrário da letra da legislação agora aprovada, que tão simplesmente pretende desconcentrar um conjunto de atribuições de natureza administrativa, sem salvaguardar convenientemente a gestão de recursos humanos, logísticos e financeiros para as autarquias.
Decorrido quase um ano desde o tal encontro de boas vontades de Sintra, verificamos que o processo legislativo em causa não parece colher a anuência da maioria dos autarcas, pela sua inexequibilidade administrativa e financeira.
O processo legislativo em causa, traduz-se pela aprovação de um pacote de 21 diplomas sectoriais, dos quais 11 já foram publicados, designadamente no âmbito da saúde e educação, faltando ainda aprovar o decreto que define novas atribuições para as freguesias, entre outros.

Segundo o Jornal Público de 21 de Janeiro de 2019, num universo de 278 municípios e 23 entidades intermunicipais do continente, cerca de meia centena de Câmaras de todo o país (PS, PSD, CDU e independentes), decidiram rejeitar todas as competências, ou então aceitar só uma parte das novas atribuições que a lei lhes confere, sendo que pelo menos mais 14 municípios (incluindo alguns de maioria PS) anunciaram que irão também recusar a transferência de competências em 2019.
Os autarcas que recusam receber as novas competências do Estado central alegam, entre outros motivos, a ausência de uma clara definição da transferência de verbas para o exercício das novas funções ou a necessidade de avaliar o impacto que terão na estrutura orgânica das câmaras, nomeadamente ao nível de recursos humanos.

Sobre esta matéria, não se conhece qualquer posição do município da Figueira da Foz, sendo que se afigura bastante oportuno e premente que a Câmara informe os seus munícipes sobre o que é que pretende fazer no âmbito da descentralização, no que se refere aos 21 diplomas sectoriais aprovados, designadamente ao nível de algumas matérias particularmente sensíveis para a Figueira da Foz como por exemplo:
§  - Gestão de áreas portuário-marítimas e áreas urbanas de desenvolvimento turístico e económico não afectas à actividade portuária, nomeadamente áreas relacionadas com actividade náutica e de recreio, áreas dos portos de pesca secundários, áreas sob jurisdição dos portos sem utilização portuária, bem como competências de licenciamento, gestão e fiscalização de áreas portuário-marítimas e urbanas não afectas à actividade portuária.
- - Autorizar a exploração das modalidades afins de jogos de fortuna ou azar e outras formas de jogo, com excepção dos jogos sociais e apostas desportivas afectos à Santa Casa da Misericórdia. Para não falar em outras competências, como por exemplo as afectas à saúde, onde, de acordo com o novo quadro legal, as autarquias terão de participar no planeamento, na gestão e na realização de investimentos relativos a novas unidades de prestação de cuidados de saúde primários, nomeadamente na sua construção, equipamento e manutenção.

Para dar cumprimento aquelas e a outras novas competências administrativas, o executivo camarário terá de identificar os recursos humanos necessários existentes na autarquia, e muito provavelmente terá de recrutar outros tantos, para dar cumprimento ao pretendido na lei, designadamente ao nível das novas qualificações, competências e formação dos trabalhadores, bem como dos consequentes recursos financeiros e administrativos para dar resposta ao processo de desconcentração de procedimentos da Administração Central.

Estas e muitas outras questões que os serviços da autarquia já deverão ter equacionado (esperemos!), deverão resultar em decisões deliberativas, quer em sede de reunião de Câmara, quer na Assembleia Municipal, por forma a comunicar a respectiva decisão de aceitação ou não da transferência de competências, à Direcção Geral das Autarquias Locais até ao final do prazo legal, tal qual já fizeram mais de ½ centena de câmaras em todo o país.
 A Câmara não fará mais do que o seu dever e os figueirenses agradecem ser informados.
João Saltão.

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