Do "Portugal dos Pequeninos"
O
"O mundo em que vivemos desde 1948 começa a cair aos bocados; e não se vê um remédio razoável no horizonte. A desculpa tradicional dos portugueses para as suas desgraças costuma ser a de que “também sucede lá fora”. Desta vez, não é mentira. A extrema-esquerda, para efeitos práticos, não existe. O PS, em guerra civil, não inspira confiança a ninguém: Seguro e Costa, com ligeiras variantes de tom, propõem a mesma receita utópica de salvação. O PSD e o CDS falharam e o Tribunal Constitucional não se irá embora amanhã. O Presidente da República, reduzido a pregar o entendimento e o “consenso” a uma multidão política que se odeia, e a um eleitorado na miséria, não serve para nada. Pouco a pouco, o país foi ficando ingovernável, no meio da resignação pública e privada. E não se imagina nenhuma força, ou conjunto de forças, capaz de restabelecer uma ordem e um desígnio. Isto não teria grande importância em tempos normais. Mas sucede que os problemas de Portugal não se resolveram com o programa de “ajustamento”, que se limitou a um exercício contabilístico e recuou perante as verdadeiras reformas. Nem o desgraçado défice se “consolidou” abaixo do que a Europa manda, nem a dívida diminuiu, nem o “crescimento” e o “pleno emprego” saíram miraculosamente da cabeça de Passos Coelho. Voltámos, depois de muita gritaria e autêntica pobreza, à situação de 2010-2011. Com algumas diferenças. O tal “povo que aguenta tudo” não aguentará uma nova dose de “austeridade”. A direita e o dr. Cavaco, que em 2011 eram de certa maneira um recurso, perderam a confiança e o respeito dos portugueses. No deserto de hoje o mínimo solavanco sério é a porta para um desastre como nunca antes conhecemos.»
Vasco Pulido Valente, Público
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