Da Alameda à Aula Magna: uma aventura no País do Betão
Um texto lúcido e oportuno de Francisco Caeiro in "Pomar das Laranjeiras" ... sublinhados meus.
Um
estudo hoje apresentado contabiliza que Portugal recebeu 9 milhões de euros por
dia num total de 81 mil milhões de Euros desde que em 1986 aderiu à União
Europeia, então Comunidade Económica Europeia.
Deste
dinheiro, para além de embarcações de pesca destruída, cursos de formação
profissional e outros, a maior fatia foi utilizada em obras de betão com
destaque para as vias rodoviárias que todas somadas em extensão permitiriam
ligar Lisboa a Nova Deli.
Se
tivermos em conta que no inicio da década de oitenta estivemos nas mãos do
Fundo Monetário Internacional e que há dois anos para lá voltámos, poderemos
dizer que de pouco valeu este aporte de capital que ocorreu num quarto de
século, dinheiro sucessivamente utilizado na construção das fachadas que
através de uma ilusão de desenvolvimento foram alimentando as campanhas
eleitorais e o perpetuar de uma classe política no assento do poder.
O
betão é a marca de um certo novo-riquismo bacoco e vaidoso que com raríssimas
excepções apodrece sempre e desemboca na penúria devido à carência das raízes
do bom senso e da consequente e incompetente má gestão.
O
betão posto ao dispor da vaidade que perpetua os nomes na pedra ou no bronze
das placas de inauguração de pontes, rotundas e estádios.
Hoje
é quinta-feira de Corpo de Deus e por “sugestão” dos nossos credores e pela
primeira vez desde há muitos anos, não é feriado nacional. As estradas
perfeitas do melhor alcatrão, antes engarrafadas no inicio de um fim-de-semana
prolongado, estão assim tristemente vazias alinhando-se em destino com os chalés
do dinheiro fácil que rapidamente se colocam na antecâmara da penhora.
E
se os políticos tivessem vergonha viriam pedir desculpa e sairiam de mansinho,
mas como não…
Hoje
mesmo, o Dr. Mário Soares, ícone maior da nossa política, da adesão à “Europa”
e que, entre muitos outros cargos, foi neste quarto de século, Presidente da
República durante 10 anos, chamou à Aula Magna da Reitoria da Universidade de
Lisboa, os partidos da esquerda para um consenso que tem em vista derrubar o
governo.
Há
alguns anos fez o mesmo quando subiu à fonte luminosa para derrubar… a esquerda
com a inevitável ajuda e inspiração do “amigo americano”.
Se
tivesse idade eu teria ido com ele à Alameda D. Afonso Henriques para ajudar a realinhar
a liberdade de Abril e matar a tentativa de ditadura de inspiração soviética e
cubana que se implantava.
Com
esquerda, direita ou centro, eu também gostava de ir à Aula Magna falar de um
novo governo com gente mais competente e munida de mais sensibilidade social e
menos colagem aos “mandamentos” dos credores.
Mas
há algo que definitivamente me distingue do Dr. Mário Soares: entre a Alameda e
a Aula Magna eu lutei sempre pelo meu país e ele lutou sempre para manter e
reforçar o poder no seu país, que é também o meu país.
E
como ele, muitos políticos da esquerda à direita para quem Portugal foi apenas
um palco para a vaidade vã do poder e nunca um terreno para cultivar o
desenvolvimento e melhorar a qualidade de vida dos cidadãos.
E
esta diferença que parece desprezível tem o valor de 81 mil milhões e tem o
peso de muita dor, desemprego e fome.
Não
basta haver novas políticas, a coerência exige novos agentes na política.
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