Enviado hoje pelo meu amigo e ilustre linguista Zé Armindo de Morais
E quando pensava que já tinha ouvido tudo acerca da crise, de repente fica-se a saber que, gramaticalmente, é muito difícil que Portugal vá à falência. E, enquanto for gramaticalmente impossível, eu acredito.
Justifico esta ideia com a seguinte teoria fascinante: normalmente, considera-se que o verbo falir é defectivo. Significa isto que lhe faltam algumas pessoas, designadamente a primeira, a segunda e a terceira do singular, e a terceira do plural do presente do indicativo, e todas as do presente do conjuntivo. Não se diz "eu falo", "tu fales", nem "ele fale". Não se diz "eles falem".
Todos os modos e tempos verbais do verbo falir se admitem, com excepção de quatro pessoas do presente do indicativo e todo o presente do conjuntivo. Em que medida é que isto são boas notícias? O facto de o verbo falir ser defectivo faz com que, no presente, nenhum português possa falir. Não é possível falir, presentemente, em Portugal. "Eu falo" é uma declaração ilegítima. Podemos aventar a hipótese de vir a falir, porque "eu falirei" é uma forma aceitável do verbo falir. E quem já tiver falido não tem salvação, porque também é perfeitamente legítimo afirmar: "eu fali". Mas ninguém pode dizer que, neste momento, "fale".
Todos os modos e tempos verbais do verbo falir se admitem, com excepção de quatro pessoas do presente do indicativo e todo o presente do conjuntivo. Em que medida é que isto são boas notícias? O facto de o verbo falir ser defectivo faz com que, no presente, nenhum português possa falir. Não é possível falir, presentemente, em Portugal. "Eu falo" é uma declaração ilegítima. Podemos aventar a hipótese de vir a falir, porque "eu falirei" é uma forma aceitável do verbo falir. E quem já tiver falido não tem salvação, porque também é perfeitamente legítimo afirmar: "eu fali". Mas ninguém pode dizer que, neste momento, "fale".
Acaba por ser justo que o verbo falir registe estas falências na conjugação. Justo e útil, sobretudo em tempos de crise. Basta que os portugueses vivam no presente - que, além do mais, é dos melhores tempos para se viver - para que não "falam" (outra conjugação impossível). Não deixa de ser misterioso que a língua portuguesa permita que, no passado, se possa ter falido, e até que se possa vir a falir, no futuro, ao mesmo tempo que inviabiliza que se "fala", no presente. Se eu nunca "falo", como posso ter falido? Se ninguém "fale", porquê antever que alguém falirá? Talvez a explicação esteja nos negócios de import/export. Nas outras línguas, é possível falir no presente, pelo que os portugueses que têm negócios com estrangeiros podem ver-se na iminência de falir. Mas basta que os portugueses não falem (do verbo falar, não do verbo falir) acerca de negócios com estrangeiros para que não "falam" (do verbo falir, não do verbo falar). Eu tenho esse cuidado, e por isso não falo (do verbo falir e do verbo falar).
Bem sei que o prof. Rodrigo Sá Nogueira, assim como outros linguistas, se opõe a que o verbo falir seja considerado defectivo. Mas essa é uma posição que tem de se considerar antipatriótica. É altura de a gramática se submeter à economia. Tudo o resto já se submeteu.
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